sábado, 23 de julho de 2011

Entrevista com Gleciara Ramos

Em entrevista a Lupa Digital, Gleciara fala sobre direitos do público e o movimento cineclubista no Brasil e em Salvador
Gleciara Ramos - Diretora regional do Conselho Nacional de Cineclubes
A entrevista começa em sua casa e ao entrar, ela já me avisa: “Casa de artista plástica é assim mesmo, tem muita coisa, muita informação”. E realmente têm. As paredes estavam completas por quadros feitos por ela e a sala também preenchida com suas peças. Além disso a informação fluiu durante a entrevista, num papo que começou com o objetivo de saber um pouco mais sobre o papel do Conselho Nacional de Cineclubes, Gleciara é a diretora-regional da Bahia-Sergipe, conversamos sobre a história do Conselho, a história do movimento cineclubista e os direitos do público ao acesso à informação e à diversidade cultural, além do processo de produção dos filmes no Brasil.
Início do cineclubismo e desenvolvimento do CNC
“Os cineclubes nasceram com a classe operária em diversas partes do mundo e nos Estados Unidos pelos profissionais liberais. Os clubes de cinema quando nascem, como no exemplo do Walter da Silveira nascem com os profissionais liberais, os advogados, os intelectuais, que já conheciam o cinema, que já eram amantes do cinema. Nesse momento de nascimento, o cinema brasileiro já estava em uma crise. Só no início do cinema o cinema mais visto era o brasileiro, como aconteceu na mairias dos países.  Até o cinema americano chegar e monopolizar a exibição dos filmes americanos. O Conselho Nacional de Cineclubes nasce na década de 1960, mas o cineclubismo tem 80 anos. O cineclubismo nasceu em 1928. O CNC se desenvolveu e teve uma atuação muito grande na época da ditadura militar, depois ele teve um período de queda por conta da passagem da película para o filme digital”.
Indústria cinematográfica brasileira
“Nós temos uma produção cinematográfica grande por causa das leis de incentivos fiscais. A Embrafilm era um empresa, que investia em seu dinheiro e tinha parte do seu dinheiro de volta com bilheteria. O financiamento público hoje é totalmente doação do governo, não tem retorno. O povo que paga, através dos seus impostos,  os filmes que são produzidos dessa maneira. Mas eles não são exibidos. O Brasil carece com salas de exibição. Só aqui na Bahia é que tem cinemas de arte no Nordeste, além daqui só em outras capitais de outras regiões. Mesmo assim, você não atinge um grande  público, só atinge o público de classe média.
O grande público, que nas capitais está na periferia, a maior parte da população hoje mora na periferia, não vê cinema. A televisão também não passa esse cinema. Esse cinema é feito com dinheiro público, mas o público não vê”.
Parceria do CNC com o Ministério da Cultura
“O Minc reconhece isso, o governo federal ainda de maneira modesta e tímida reconhece. Está começando a haver um investimento, e vão abrir salas de cinemas comerciais, além das salas de culturas, que são cineclubes, em parceria com o CNC. O CNC que está monitorando. O CNC que vai dar as oficinas, o Minc dá o equipamento (datashow, telão, quatro caixas de som, mesa de som amplificada). É um reivindicação do movimento cineclubista que esses filmes brasileiros, que foram produzidos com o dinheiro público estejam à disposição de qualquer um e de forma mais barata.
E quais são os direitos do público?
“É o direito de poder escolher o que se passa não só sala de cinema, mas também na televisão. É o direito de acesso a informação e a cultura. Por exemplo, nós temos a produção nacional de filmes, mas quase ninguém vê esses filmes.  É a nossa cultura, se você não tem acesso á diversidade cultural as diferenças  culturais começam a se perder. Se você compreender o patrimônio cultural como um bem, mesmo que imaterial, você entende que esse bem material está sendo roubado, porque as pessoas não estão tendo acesso a ele.  Isso é um direito coletivo, não é de uma geração só. Compromete toda uma coletividade, toda a geração futura”.
Funcionamento da produção de filmes brasileiros
“Alguns realizadores de filmes brasileiros têm a seguinte posição: eles têm o dinheiro do governo para realizar seus filmes e depois de feitos não se importam com a exibição. Pois o filme já é feito com tudo pago. Não se importam se vão ser visto ou não. Você termina o seu filme sem dever a ninguém e com dinheiro no bolso. Não existe estrutura de exibição e não existe estrutura para copiar filmes de 35 mm. A distribuição é cara o governo nunca investiu em uma distribuidora.
O melhor para eles, ao invés de se esforçar para exibir seus filmes, é entrar em outro edital para produzir outro filme que também não vai ser visto. Eles vivem de edital em edital produzindo filmes que ninguém vê, além da própria comunidade intelectual. O fenômeno da comunicação não se dá, mesmo assim, o dinheiro é público. Não há o termômetro do público, para julgar se o filme produzido foi bom ou não porque simplesmente o filme não é exibido”.

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